sábado, 3 de abril de 2010

Jornalismo Inteligente

Vou abrir este blog falando sobre algo em que tenho pensado há algum tempo: qual o critério para se selecionar os repórteres de telejornais? Lembro ter assistido a uma reportagem sobre as inundações que ocorreram no interior do Rio Grande do Sul há alguns meses. Diante de uma família que havia perdido a casa, mobília, plantação e tudo mais o que tinham exceto as vidas, o repórter fez e curiosa pergunta: "vocês estão tristes?"
Que diabos ele estava querendo ouvir como resposta? "Não, aqui na nossa cultura nós vemos a destruição total e completa da nossa cidade com bons olhos. Somos todos seguidores de Rã's Al Ghul."? E parece que virou uma questão padrão para vítimas de desastres ou violência.
Ainda tem as ocasiões em que os próprios repórteres fazem esse tipo de pergunta já respondendo como "Vocês estão tristes, certo? Desesperados? Estão se sentindo mal, mas vão recomeçar do zero?", e as pessoas que além de terem de sobreviver às suas desgraças, tem de aturar este tipo de pergunta, e ainda em choque só conseguem repetir o que o repórter já disse "Estamos tristes... Desesperados... Estamos nos sentindo mal e teremos de recomeçar do zero...". Realmente é uma espécie bem completa e útil de jornalismo. Nessas situações eu não consigo não pensar em que tipo de formação recebeu uma pessoa dessas. Devem ser todos alunos do Instituto Epaminondas.
É um nível de falta de senso só comparável ao dos repórteres de Metropolis. Não, não venham defender Lois Lane. Alguém que não percebe que duas pessoas com quem se convive, de rostos idênticos, com a mesma voz, estatura e porte físico são na verdade a mesma pessoa só porque às vezes tira os óculos e lambe os cabelos faz com que tenha um lugar garantido neste texto. E me nego a comentar a "teoria das lentes dos óculos kryptonianas mágicas".
É uma tarefa bem árdua encontrar um telejornal não idiota hoje. Programas como o "Jornal Nacional" se dedicam a coisas como "foca empina bola na Holanda", resultado de reality shows e coisas do gênero. Um dia ainda a Globo perderá totalmente a vergonha e só terá programas como "Vídeo Show" e o do Faustão. Nos horários entre as telenovelas, claro. Nunca ameaçando as telenovelas. Ou alguém não lembra que um dia o "Fantástico" tencionou ser um programa de jornalismo. Atualmente ele já assumiu ser... Bem... Ser essa coisa que ele é.
Os jornais regionais e que passam em horário próximo ao meio-dia são bem "interessantes". Eles se iniciam com as "notícias" esportivas, que na verdade são cenas das partidas de futebol acompanhadas de algum comentário totalmente desnecessário. Praticamente metade do programa se resume a isso. Então entra o tão aguardado momento: a previsão do tempo. Aí a maioria do público fica satisfeita de poder programar sua semana toda ao redor dessa previsão, pelo menos aqueles que ainda acreditam nela. Então o horário do programa já está esgotado, e infelizmente não sobra tempo para se comentar o mais recente esquema de corrupção descoberto dentro do governo estadual. Mas afinal, quem se interessaria por isso?
Logo após o telejornal do meio-dia começa o incrível "programa de esportes", que nada mais é do que uma repetição das cenas futebolísticas já exibidas no início do programa anterior, e o restante do tempo é dedicado a fofocas da vida dos jogadores de futebol e a entrevistas de jogadores que acabam de serem derrotados em uma partida em que são obrigados a responderem a "você está triste?", "gostaria de ter vencido?" ou "vai tentar ganhar da próxima vez?". Esses programas de "esportes" são de "esportes" só no nome, porque se resumem ao futebol. ’Tá, às vezes, falam de basquete, vôlei ou ginástica olímpica, mas no máximo uma única reportagem e só quando estes atletas conseguem chegar a alguma final por mérito próprio e praticamente sem apoio. Daí, na época das Olimpíadas, esses repórteres, que acreditam falar em nome de toda a população, tem a ousadia de ficarem decepcionados quando os esportistas brasileiros não vencem. Esportistas na maioria sem patrocínio, esquecidos e a que eles não dedicaram nem cinco minutos de seus programas nos últimos quatro anos e que agora exigem deles que vençam superatletas estrangeiros treinados desde crianças com equipamentos avançados e apoio de seus Estados.
Depois vem o "Jornal Hoje" com suas "reportagens-propagandas". Já perceberam que sempre tem uma reportagem mais longa? Que ela geralmente envolve um novo tipo de produto ou serviço? E que esse novo produto é mostrado como uma coisa boa e revolucionária ao conforto da sua família? Com direito ao empresário que investe no ramo dar opiniões e demonstrar as qualidades de seu produto.
Ainda tem os programas de "notícias de artistas" da Rede TV que duram uma tarde inteira, e não chegam a ter três pautas, e estas pautas são acontecimentos dos canais concorrentes. A Rede TV é o único canal que conheço que tem todo o seu funcionamento baseado em outro canal. Nem podem ser chamados de concorrentes, é mais como o simbionte alienígena da Marvel e o Mac Gargan formando aquela versão mentalmente lesada de Venom que devora os cérebros dos telespectadores.



E os "artistas" a que se referem são no máximo pessoas que passaram por algum reality show. Eu sempre pensei que artista era alguém que se dedicava à arte. Sei lá... Goya, Da Vince, Mozart, Chaplin, Akira Kurosawa, Clint Estewood... Ninguém quer mais ser reconhecido e famoso por ser bom em algo, e sim simplesmente quer ser reconhecido pelo próprio fato de ser reconhecido. Satisfazem-se com fama sem mérito.
Tem ainda o jornalismo de desserviço público. Sabem quando um traficante de drogas que atuava em um bairro residencial é preso? Então vão lá os repórteres e falam "foi capturado graças a uma denúncia anônima. O delator não quis se identificar, mas foi um integrante da comunidade local que já havia se desentendido com o suspeito quando seu filho tentou participar das atividades criminosas". Claro, para mim e para maioria das pessoas que está assistindo o delator continuará anônimo, mas será que não é facilmente reconhecido pelos moradores locais? Quantos responsáveis por denúncias anônimas não morreram porque os repórteres não pensaram no que iam dizer antes de abrir a boca?
Têm os casos em que esses mesmos jornais vorazes por conteúdo exclusivo entram em uma cena de crime e apontam "Olha lá o cadáver da vítima! Aquele corpo estendido no chão... Aquele!". Por mais que essas imagens sejam acompanhadas de um discurso de combate ao crime e protesto, não seria isso um desrespeito ao morto e à sua família?
Ainda há o "Jornal da Band", que aparentemente é mais imparcial. Isso até a questão fundiária/ambiental vir à discussão. Pois daí as falas se tornam direcionadas, mostrando apenas os argumentos de caráter positivista que defendem a economia como o principal braço da sociedade e demonstrando como todos os demais princípios constitucionais devem ser sacrificados quando o objetivo é salvar o Mercado.
Argh! Vou parar por aqui, não porque os exemplos de telejornais imbecis tenham acabado, mas eu teria de passar ainda muito tempo escrevendo para dar conta de todos.

Um comentário:

  1. Concordo com o que você disse. Não saberia dizer qual o pior dos telejornais atuais... Jornalistas... o racinha cretina. Pior que eles, só os advogados.

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